Um 14 de março de 2020, sexta-feira, o presidente do governo anunciava que teríamos que ficar nas nossas casas durante (de primeiras) 15 dias. A sexta-feira 12 de março de 2021 ButacaZero estreia 32m2, umha comédia absurda bastante realista que pretende reflexionar sobre o que passou nestes 12 meses. E o domingo 11 de abril e o sábado 8 de maio vejo eu esta obra na Casa da Cultura de Melide e no Teatro Principal de Compostela, respetivamente.
A primeira pergunta é bastante precisa, dado o tema: porque recorrer à comédia para retratar umha tragédia como foi (e está a ser) esta pandemia? A segunda pergunta já seria “porque temos a necessidade de nos fazer esta pergunta?”, porque semelha que lhe há que ter um “respeito” a sucessos “importantes” da história, por isso de nom se burlar das mortes e cousas polo estilo, e semelha que esse “respeito” se tem de dar através dum género “sério” como o drama.
Piadas aparte, acho que o motivo polo que se recorreu à comédia é pola universalidade deste género. O drama implicaria contar umha história individualizada que possivelmente provocaria um certo rejeitamento por parte da recepçom, o drama obrigaria a umha identificaçom demasiado pessoal pra que a sociedade ainda nom está preparada, estamos a falar dum sucesso que ainda está a ocorrer. A comédia, e sobre todo o jogo tam absurdo ao que se chega nesta obra, provoca que a história poida ser “universal” (na nossa sociedade), e esta geralizaçom fai que ê espetadore se identifique com momentos concretos cum distanciamento que provoca que chegue a ver com graça as suas próprias vivências. Ao fim e ao cabo, a comédia é o que há mais lá da tragédia, esse género morto.
E logo de falar do género, temos de falar da estética, porque o primeiro no que pensei ao ver 32m2 foi na identidade de ButacaZero. E é que chegades a este ponto acho que já está o suficientemente perfilada como para falar brevemente dela. Quiçá #camiños, Despois das Ondas e 32m2, por exemplificar coas 3 últimas obras que vim delus, tenham grandes diferenças, mas tenhem alguns elementos comuns que definem à companhia: questionam através dumha história fictícia o relato criado em torno a umha história real (o relato da pandemia) e usam umha estética que combina as formas populares galegas coas linguagens cénicas contemporâneas. Já com esta tendência eu estou a desejar ver a seguinte obra desta parelha artística formada por X. Castiñeira e E. F. Carrodeguas, por serem umhes artistas claramente comprometides co aqui e o agora sociais.
E onde ficou a ideologia nesta pandemia? Esta pergunta está no questionamento que se fai nesta obra dende o começo. Na esquerda de rua sempre há esta preocupaçom polas contradiçons que temos a obriga de assumir no nosso dia a dia. E nesta obra isto fai-se patentíssimo, mas é que na realidade neste último ano assumimos contradiçons que as pessoas que nos definimos como “antissistema”, como as personagens de 32m2, nunca assumiríamos numha situaçom “normal”. Assumimos acatar todo o que diziam as autoridades sem o questionar o mais mínimo, vivemos esse absurdo de Mar pondo as luvas e quitando as luvas dependendo do que digesse Simón em cada momento. O medo, ao igual que a esta parelha, fijo que cambiássemos os costumes e as ideias.
Durante o confinamento estivemos contentes, aburrides, enfadades, confundides, excitades… Esta mistura de emoçons contraditórias no ritmo acelerado da comédia provoca o riso da comédia, nada novo. Mas desta vez as emoçons contraditórias a ritmo acelerado tivemo-las nós durante algo menos de 3 meses fechades nas nossas casas, nos que por primeira vez paramos a pensar e conversar. Na primeira cena, nessa coreografia cotiá, Mar e Xan nom falam, a sua vida é umha rotina coreografada. O paro obriga-lhes a falar. E voltam a nom falar noutros dous momentos da obra, com ritmos antagónicos, o texto passa a um segundo plano e volta cobrar importância a vida coreografada: no momento de máximo êxtase, no que o ritmo é o mais acelerado, no que passam o dia fodendo, e o momento contrário, o momento no que já, logo dum tempo, estám (estávamos) fartes deste jogo, a rotina fai que nem tenham ganas de foder e entra em jogo o ritmo oposto, esse momento que todes sofremos no que semelha que o tempo nom passa. E nesse momento a obra ainda nom está no seu ritmo mais lento, o ritmo mais lento entra em jogo na cena final, no momento no que abandonam o espaço de 32 m2 e estám numha nuvem, sabemos polo texto que estám baixo umha ponte. E nesta cena final ê espetadore passa de rir a cachom a lhe cair umha lágrima pola meixela (um recurso que nom é a primeira vez que vemos numha dramaturgia de Carrodeguas, por certo).
Há um gesto no que nos devemos parar (ou gestus, melhor dito), porque me levou a pensar na diferente recepçom que teria por umha pessoa que conhece minimamente a história do teatro e umha que nom, porque me interessam ambas, nom só a primeira. Pra alguém que nom conheça em absoluto o teatro brechtiano nesse momento seguramente sentiu igualmente que se parou o teatro, que todo se pausou, pola força que tem o gestus. Estou a falar do berro silencioso que emite Mar no meio da obra. Esse berro lembra-nos, inequivocamente, ao emitido por Nai Coragem nos anos 40, e produze polo tanto umha analogia, pra quem tenha essa referência presente, entre a Galiza pandémica e a Alemanha nazi.
E por suposto, devemos falar do espaço, o protagonista desta história. Por suposto, devemos reconhecer a cenografia de Beatriz de Veja, que nom é a primeira vez que trabalha coa parelha de ButacaZero, e já nos fica demostrado o bom trio que fam. O espaço é agoniante. O espaço é ver que 32 m2 é umha merda de espaço no que vive muita gente. Quando sentas na butaca o primeiro que vês é um espaço mínimo cum móvel central que quase o ocupa todo. Nesse móvel concentram-se todas as estâncias básicas dum piso (dormitório, cozinha e banho). Haverá espetadores que pensem que esse espaço está mui exagerado, mas esse espaço é a representaçom perfeita da merda na que vive muita gente e que só conseguimos ver com claridade através dum espaço esperpêntico. Esta é a história oculta no relato da pandemia, estes espaços agoniantes sem as famosas varandas.
Pra rematar, há pessoas às que ainda nom mencionei. O que me levou primeiramente a querer ver esta obra desde o momento no que se anunciou, sabendo que nom ia sair igual do teatro, foi a colaboraçom de ButacaZero com Rodrigo Cuevas. A música deste asturiano envolve a cena numha atmosfera criada pola combinaçom do tradicional co contemporâneo dende o começo, dende antes de precisar ver nada já temos no espaço sonoro o popular na contemporaneidade, que se desenvolve num problema de velho (a miséria da precariedade laboral) agravada por um problema atual (a pandemia). O fio da música, o espaço, a dramaturgia… vem-nos a dizer que o capitalismo, em última instância, mata.
Nom mencionei tampouco, e devo mencionar, a Nuria Gullón e Xurxo Cortázar, porque quando o trabalho interpretativo está mais que bem há-o de reconhecer. Nom é fácil atopar umha atriz e um ator que tenham essa presença e esse ritmo na cena. Por suposto, também mencionar a Beba Gayoso pola coreografia. Considero que ButacaZero reuniu à equipa perfeita, mui bem coordenada, que também é algo que nom se vê mui a miúdo, por desgraça.
Diego QS
32m2, de ButacaZero
Em Cena: Xurxo Cortázar e Nuria Gullón
Texto: Esther F. Carrodeguas
Música Original: Rodrigo Cuevas
Cenografia e Luz: Beatriz De Vega
Construçom: José Faro “Coti”
Vestiário: Alicia Root
Coreografia: Beba Gayoso
Aj. Direçom: Anxo Outumuro
Produçom e Distribuçom: Esther F. Carrodeguas
Direçom: Esther F. Carrodeguas e Xavier Castiñeira